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TEXTOS

  • Foto do escritorPlínio Zuni

Uma carta pra você que me lê




Em Dezembro de 2021, o meu livro foi selecionado como a obra do mês do Clube de Prosa da Editora Patuá. Foi um convite muito bacana, e eu fiquei imensamente agradecido, mas, por uma série de questões pessoais, acabei não divulgando por aqui. Na época, o Eduardo Lacerda — que é quem toca o front da Patuá — me pediu pra escrever uma carta pra ser enviada aos assinantes do clube. Era pra ser uma cartinha simples, mas eu me empolguei e escrevi três páginas à mão. Ainda não tive a oportunidade de conversar com ninguém que recebeu essa carta, mas espero, de todo coração, que esse texto tenha sido uma surpresa bonita pra essas pessoas. Foi muito bom escrever essa carta, mas um pouco triste, porque, infelizmente, o correio não me vai me trazer nenhum envelope de resposta. Ainda assim, passei dias imaginando como seria a reação destas pessoas, meus correspondentes anônimos que, ainda que desconhecidos, já são, de certa maneira, meus confidentes íntimos.


Assim, o melhor que posso fazer é reproduzir essa carta aqui, na esperança de que esse texto também faça sentido pra Você, que agora me lê por aqui.


 

Uma carta pra você que me lê:


São Paulo, 15 de Dezembro do Segundo Ano Pandêmico


"Olá, “Você que me Lê”! Como vai esse fim de ano? Espero que, apesar dos perrengues, tudo esteja relativamente bem por aí.


Sabe, “Você que me Lê”… Preciso te confessar uma coisa… Não me leve a mal, mas é um pouco estranho escrever este texto sem nem sequer saber o seu nome. Talvez porque isto não é um conto, um prefácio ao meu livro, um artigo crítico, nem muito menos uma peça publicitária, não, nada disso… É que esta é (ou, pelo menos, eu sinto como se fosse) uma carta carinhosa de um longínquo pré-amigo. Um aceno, um abraço, um apelo por diálogo, um emoji de “oi sumido!”, um convite pra um café… E me desculpe se eu estiver forçando a barra nesta nossa tão recente relação literária, mas é que, depois de tanto tempo em confinamento — assim como a pomba na capa deste livro que agora você compartilha comigo —, creio que estamos todos carecidos de contato, não concorda?


O caso, “Você que me Lê”, é que toda leitura é uma troca.


Junto com esta carta, também te envio um pedaço daquilo que tenho de mais íntimo. No meio deste livro, meti os retratos das minhas famílias, mil e uma sessões de terapia, as piadas que ouvi dos cânones universitários, as teorias mais líricas que aprendi na fila do trem, além de um mapa de cada esquina, praça, utopia e estrada pedregosa em que já tropecei. No recôncavo das vírgulas escondi meus receios, e entre os vãos das reticências plantei as sementes daquilo que me exclama e queima por dentro. Tudo isso, “Você que me Lê”, é o que eu te entrego agora, de peito aberto.


Mas, (in) felizmente, “Você que me Lê”, tudo isso ainda é pouco…


Sim, é um fato. As vozes, os rostos, as vidas e sonhos que acomodei no meio destes contos ainda são muito pouco pra preencher o vasto espaço em branco das páginas. E que bom que é assim! Porque este livro, “Você que me Lê”, não é uma biografia. Ou, pelo menos, não é (apenas) a minha. Pois, assim como a cidade não é feita de edifícios, também os livros não são selfies do arquiteto. As histórias, como as ruas, são de quem por elas circula. No fim das contas, o que importa não é o nome gravado em dourado na porta do prédio, e sim as pessoas que nele habitam.


É por isso, óh queride “Você que me Lê”, que é estranho te escrever sem saber o seu nome. Porque eu quero que cada conto desse calhamaço lhe faça um convite. Quero que você caminhe comigo, conduza o percurso e me conte o que pensa. Quero que você folheie o meu álbum e encontre nas fotos a sua família. Que os seus lábios refaçam meus versos, que o meu ritmo espelhe o seu passo, e que sua língua se mescle com a minha. Afinal, “Você que me Lê”, toda leitura é diálogo… Ou não é?


Enfim, o importante é que minhas duas cartas chegaram até Você.

Espero que Você aceite meu convite. Que essas histórias te ressoem. Desejo, acima de tudo, que Você encontre o que brilha no meio das manchas do córrego. E se depois Você quiser me contar o seu nome, vai ser um prazer me tornar “Aquele que te Lê”.



Com carinho, do seu escriba

Plínio Zuni"







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