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  • Foto do escritorPlínio Zuni

Labirinto sem saída

Conversando com um taxista em Beit Sahur, contei os locais por onde viajei. Haifa, Nazareth, Jerusalém, Hebron, vale do Jordão, Nablus, Jenin e diversas vilas por toda a Palestina. “Você conhece esta terra muito bem”, ele me disse.

Labirinto sem saída

Empolgado com a abertura, comecei a tagarelar sobre como eu achava que a única maneira de realmente entender a Palestina, pra um estrangeiro, é conversar com o seu povo e ver de perto o que os documentários e filmes não mostram. Percebi que ele ficou incomodado e parei. Seguiu-se um minuto de silêncio, ao fim do qual ele me disse, emocionado e talvez um tanto ressentido: “Você conhece a minha terra melhor do que eu”.


Não posso imaginar o que seja viver em claustro por toda uma vida. Um palestino pode comprar um carro, encher o tanque de combustível, mas não pode seguir por duas horas em uma estrada sem bater em um muro de oito metros de altura. e precisar voltar. Rodar em círculos por toda uma vida, como ratos num labirinto. Andar por uma estrada e se deparar um com checkpoint flutuante, uma barreira surpresa que o fará parar, ter seu carro revistado, seus documentos checados, sua identidade questionada.


Por três vezes nas últimas três semanas estive em um ônibus de turismo cheio de brasileiros que foi parado em checkpoints. Descemos, tivemos nossas bagagens revistadas, nossos passaportes olhados com desconfiança. Precisei camuflar cartões de visita palestinos para evitar interrogatórios mais demorados. pessoas do meu grupo foram chamadas aleatoriamente para uma sala privada.


Toda vez que estou em um ônibus em direção à Jerusalém temos que parar em um checkpoint. Todos os palestinos são obrigados a descer para serem checados. Estrangeiros (se forem brancos) não precisam descer, mas desço assim mesmo. Soldados entram no ônibus, checam seu passaporte, perguntam de onde você veio.


Todas as manhãs centenas de palestinos que possuem vistos de trabalho cruzam checkpoints para limpar banheiros de israelenses, coletar lixo, servir-lhes como garçons e cozinheiros, limpar a sujeira com que os colonizadores conspurcam a terra que lhes roubaram, em troca de um salário miserável e alguma mínima possibilidade de movimento. Todas as madrugadas, os palestinos que tiveram a sorte de conseguir uma licença para trabalhar nos Territórios Ocupados de Israel se enfileiram em um corredor claustrofóbico, passam por uma grade, atravessam um grande pátio vazio cercados por torres de vigilância com atiradores nas cabines, passam por outra grade de acesso, tem suas bagagens checadas, passam por detectores de metal, apresentam seus documentos, passam por um terceiro portão e chegam do outro lado, onde são recebidos por cartazes que mostram famílias brancas e sorridentes brincando na praia com a cruel e mentirosa frase: “bem vindos à Israel”.


O motorista do táxi que eu tomei não tem a sorte de poder atravessar postos de controle e ser humilhado diariamente. Ele não tem a permissão legal para cruzar um checkpoit. Precisa se contentar com as áreas cercadas por soldados e muros. Nasceu confinado, e provavelmente morrerá assim. Rodando em círculos em um labirinto, enquanto ouve rumores distantes de seu país que desconhecido.

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